sábado, 26 de março de 2016

O CAMPO MINADO

Desculpem os meus amigos acadêmicos, mas não encontro sentido em fazer da arte uma "investigação de campo". 
Investigação, pra mim, é coisa de puliça. Campo é a casa do criador de gado. 
Claro, de certo modo, todos nós somos uns inventores e as nossas obras são um mundo de perguntas. Mas é só essa a função, a sina da questão. Resposta decreta a morte e pior do que ter a resposta é ter a vaidade de acreditar que sua pá dourada vai cavar na areia e encontrar um fim.
Quando você sistematiza mais do que um dia da sua vida criativa, me parece que você padroniza a arte, deixando ela de ser arte e virando uma receita trivial.
Quando você se afoga no vício de um planejamento e faz anotações em busca dos porquês e, finalmente, encontra as respostas, provavelmente você está pronto pra morrer, você não presta pra mais nada, você não vê mais sentido em gozar, surpreender-se, desesperar-se, desentender, convulsionar e errar.
A mim, me parece arrogante, soa estéril fazer da arte uma ciência, como é uma tolice tentar defini-la.

biAh weRTher

terça-feira, 22 de março de 2016

Eu no KBEATS Vol.1

>/CONVITE\>.....................>/CONVITE\>
Chove agora, Outono
Pois meu conforto é o Sol e o meu Sol foi dar um tempo
Emprestou o meu casaco - Sol também se resfria no vento
Chove agora, Outono
Escorre dentro de mim pra lavar esta vontade
e sair pelos meus olhos, pela boca, das narinas
Pela ponta dos dedos, úmidos, visgo, cafeína
Toda vez que é outono e o Sol vai pro relento
bebo o vinho e evaporo
sinto as gotas e me aqueço
É assim como uma sina
Toda vez que é outono e o meu Sol sai ao relento
biAhweRTher
>>>Quinta,24 mar, transpareço na Casa Frasca, parte do evento KBEATS Vol.1. Na apresentação da minha obra, a presença do também multiartista Iago Gutierre e os registros do Raphael Carrozzo<<<<
VENHAM, 22h, Independência - 426




sexta-feira, 18 de março de 2016

Todas as Mulheres do Cinema

Convido todos os que estarão em Porto Alegre neste final de semana a aparecerem na Mostra Todas as Mulheres no Cinema.
O meu filme DANS[SA], com a atriz Renata de Lélis, está na programação. O curta, em 16 mm, é uma produção do Cinema8ito e faz parte dos 5 curtas do projeto FBI. 
Visitem o site da mostra, está bonito o programa.
https://casapeiro.wordpress.com/2016/03/08/todas-as-mulheres-no-cinema-mostra-de-curtas-metragens/





A histeria digital é ancestral.

Mesmo antes de Goebbels, mesmo antes da caça às bruxas, a histeria sempre foi a arma política de efeito mais certeiro.
Agora que o golpe está se desenhando no grito e na pancadaria, o Brasil será devolvido para os colonizadores ("Nos devolvam o Brasil", é o que se escuta entre os defensores do fundamentalismo).
Á força, Dilma está impedida de governar, pararam o país, ninguém sabe qual foi seu dia de trabalho ontem, se sancionou ou vetou alguma lei que nos interesse. O país parou e todos vamos pagar caro por isto.
Há milhões de pseudo ricos advogando pela própria escravidão, E como ninguém gosta de história, vejo gente festejando nas passeatas, rumo aos seus piores tempos, como boiada que caminha pro matadouro.
Se acontecer o golpe, a nação relaxa. Ninguém aguenta mais sindicatos, representações, direitos humanos, leis protetivas pra qualquer grupo esdrúxulo.
Os negros voltarão para a cozinha, as mulheres voltarão para a cozinha, as crianças pobres voltarão para o borralho, os latinos voltarão para a cozinha, os sem terra voltarão para a cozinha, casais gays precisam voltar pra o armário (da cozinha)... Bá, vai ficar intransitável essa cozinha!!
Sem cotas, sem ações afirmativas, sem saco pra igualdade, sem casa, sem quintal, sem escola, sem nada, o país vai ficar servil como já foi. Para cada 5 na casa grande, 5 mil a servi-los sem uma constituição que os proteja.
Tecnicamente, acho interessante um fenômeno arcaico continuar funcionando através dos séculos. A manipulação nos faz ver que não interessa se temos internet, acesso à informação em tempo real e veículos diversos, outros pontos de vista e alternativas para refletirmos livremente, pra exercitarmos o diálogo da sensatez.
A massa não sabe ler, a massa está ocupada xingando, está em comoção e na histeria não vê as fontes menores.
Já diziam os sábios de todos os credos, se você está em fúria, não pondera. Respira, acalma, espicha o pensamento...
Pensando em pensar, repito o que rezamos há anos sobre o nosso modelo político, onde tudo é mais do mesmo e uma hora tinha que implodir.
Você não faz esquerda namorando com a direita.
A presidenta nos apresentou parceiros políticos difíceis de digerir num momento em que o país se pretendia moderno e democrático. 
De representantes pastores em um Estado que deixou de ser laico até uma coronela latifundiária escravista. Dilma namorou com o diabo por imposição do partido.
Os mais velhos, pra falar bem ou mal dela contam o mesmo conto. Dilma era uma guerrilheira foda, dura na queda.
Porém, nem precisamos vê-la ao lado de Kátia Abreu ou Michel Temer pra saber que ninguém chega ao poder em nosso sistema sem beijar o diabo.
Tempos obscuros se aproximam, pessoas com "cara de esquerdistas" já são linchadas nas ruas por senhoras que ontem pareciam sãs, fazendo suas compras no xópin.
Caso venham outros 20, 30 anos de zumbilândia, desigualdade e medo até outras gerações saírem pra rua e reiniciarem um novo ciclo, veremos, velhinhos como viram nossos pais, a Globo viva mentindo que era apenas um canal informativo e não apoiou o golpe.
Veremos pessoas com cara de paisagem, que estiveram dançando sobre tumbas e acendendo as fogueiras, alegando que nunca foram coniventes com o golpe. Todos, do nada, serão apenas vítimas.
A falta de educação, a desinformação, a recorrência e a fofoca são e sempre serão a carta na manga dos poderosos e suas eminências.
>bw<

quinta-feira, 17 de março de 2016

Ontem eu vi o Cigano Igor e fiz retrato de uma revolução perfumada.

Bom dia lindo dia!
O que dizer de uma geração que só sabia fazer compras e quando acorda pra política sai pra rua com roupas de marca e uma lata de cerveja na mão gritando em coro: "Vai tomar no cu"?
Ontem, saindo do estúdio onde eu estava trabalhando, passei pela calçada da fama e fui gravando as vísceras da passeata até chegar na João Teles.
Não tinha nada de muito interessante pra retratar, na verdade. Carros importados buzinavam, senhores bem vestidos saíam de bistrôs lindamente iluminados com luz de velas e gritavam: "Vagabunda". Jovens corriam com o celular na mão, prontos pra festa, procurando os amigos; sentadas nos cafés mais chiques da cidade diante de drinques e acepipes, senhoras comentavam orgulhosas seus posts de "Lula cachacheiro" no feicibuque.
Eram pessoas brancas, cheias de perfume, numa espécie de micareta da zona nobre, Tentei entrevistar porteiros e serviçais, que eram os únicos não brancos, mas os olhares eram severos e eles ficavam tensos, tímidos, sacudiam a cabeça num não.
As meninas loiras desfilavam com a bandeira do Brasil numa performance que me lembrou os desfiles de 7 de setembro que as escolas faziam quando eu tinha 8 anos e loiras bonitas da oitava série eram destaque fazendo piruetas e todos cantavam o hino nacional. Sério, i-gual-zi-nho!!
Em dado momento, avistei o Cigano Igor! Levava um ar de líder, a caráter com bandana verde e roupa de academia levando uma bandeira do tamanho de seus músculos. A propósito, muitas pessoas com lindos corpos usavam roupa de ginástica. Quem passava à margem do desfile de grife com alguma roupa que destoasse tornava-se alvo de olhares hostis e logo era apontado, tinha que desviar o caminho. Eles estavam exaltados e logo descobriam os inimigos infiltrados.
Em nenhum momento conseguimos escutar qualquer discurso politizado, alguma palavra de ordem com algum pedido concreto.
Senhoras chiques gritavam: "Dilma vagabunda!".
Me pareceu que ali, a ideia transcendia qualquer apelo político. Estive no meio dos rebeldes de vitrine e, pertinho da miscelânea de fragrâncias importadas, entre algumas pessoas que ainda não sabiam bem como se age na rua, - pois novatas em momentos mundanos que não fosse aquele carnaval em Salvador em 1996 - e outras já mais descoladas, se divertindo com amigos; caras malhados de olho nas meninas, casais caros com cachorrinhos de marca, vi algo positivo que unia a todos.
Vi que, agora, gente que devorou livros de boas maneiras tem um lugar pra falar palavrão aos berros. É como uma terapia em grupo. Muito melhor que copa do mundo e carnaval. Senhoras com aaaanos de trauma porque não puderam gritar "porraaa!" quando alguém pisou no seu pé naquele jantar no Juvenil em 1965 soltaram finalmente o urro: "Putaaaa!"
Achei bonito, viu.
Até que começaram a me estranhar e eu, que não sou boba nem nada comecei a gritar: "É isso, morte aos bolivarianos"; E meus amigos gritavam: "Corta a barba desses comunistas". E eu fiquei louca e abri os braços e gritava e os senhores faziam festa pra mim e eu dizia: "MORTE AOS COMUNISTAS!";
Foi uma be-le-za!
Depois, já no meio da Independência, um maior número de pessoas estranhas ao desfile começaram a aparecer ao redor pra assistir e, de repente, os manifestantes pararam como quem não soubesse pra onde ir. Estavamos nos distanciando demais das lindas ruas ricas, o que fazer? O grito arrefeceu... murmúrios. Uma jovem com a bandeira falou: "- Mãe, pra lá é o centro?"
Percebi um certo desconforto de alguns ao se afastarem do Moinhos de Vento. Creio que eles deram ré e foram pro Parcão, porque ir pra rua tudo bem, mas centrão já é demais.
Descemos a João Teles rumo ao aniver do Fredi Chernobyl. Eles ficaram lá, liderados pelo Cigano Igor.
Foi lindo.
Assinado: A rapariga que foi na manifestação e gritou um monte de palavrão oba!
>bw<

segunda-feira, 14 de março de 2016

A vida não precisa morrer antes de você perceber.

Sobre a comoção ontem, no Tributo ao Júpiter Maçã, queria refletir aqui,discretamente, no meu cantinho...
Ali, com as minhas lentes - melhores amigas por detrás de quem me oculto sempre nos grandes encontros - me deixei observar pessoas que conheço há tanto tempo, rindo e chorando, dividindo.
E aquela hora que quase todo mundo foi pro palco mas alguns ficaram encolhidos num canto com o olhar em outro espaço-tempo e não ousei retratar o momento, conexão íntima;
E as pessoas com quem falei e que me abraçaram com um carinho que naquele exato instante parecia, talvez, mais verdadeiro porque a morte tem um papel paradoxal; ela une, desnuda.
Parece que a falta despe a gente, desburocratiza. Parece que é preciso morrer pra daí ser real a aceitação, reconhecimento entre os pares.
Pois, na verdade, somos todos da mesma turma, não interessa se alguns tem gravadora outros não; alguns grandes produtoras outros não; alguém ficou famoso o outro não; alguns preferem ser independentes, outros querem segurança; alguns são loucões, outros acadêmicos.
O que ficou pra mim, ali, vendo a noite por detrás da grande angular, da macro, da objetiva, foi a verdade que todo mundo quer, mas muitos temem; sobre valorizar o outro, desprezar as competições vazias, admirar as pessoas enquanto elas estão vivas, fazer homenagens todo santo dia.
Por mim, as pessoas ficariam sempre naquele estado que estavam ontem, sempre assim, pura emoção.

]bw[