segunda-feira, 30 de maio de 2016

uma porta encerrada

dentro do meu vazio
há um lugar secreto
porão de um navio
onde navego morta
com um pequeno buraco
por onde observo a vida

e há uma porta
na forma de uma ferida
fenda aberta nas tuas costas
no meio das minhas pernas
por onde escondi as asas
quando caminhei nas ruas
no eco das palavras tuas

aqui ninguém me invade
daqui ninguém me escuta
daqui ninguém me expulsa
ela é fora, ela é dentro
ela é longe do meu centro
ela é tudo o que tenho

os mistérios que eu lia
mas você me proibia
cemitério das verdades
o fogo que consumia
no porão da eternidade
o olho, a negação
a maldade

]bw[

sábado, 28 de maio de 2016

Eu na Península.

Adotei meu nome artístico na adolescência , dentro de um momento de profunda depressão, querendo viver de arte, saindo da casa dos pais como uma espécie de renegada, me sentindo velha, engolindo a vida a seco e repetindo: eu aguento. Morei sozinha numa casa gigante de 4 quartos, quase sem móveis, uma goiabeira e 30 gatos. Foi onde aprendi a fazer partos felinos e comida vegana. Na época eu andava pelas ruas com o Werther embaixo do braço, era frio e eu criava roupas pretas... Pouco mais tarde viria meu filho e eu fundaria, entre outros oitos, o Cinema8ito. Na apresentação do evento onde participo dia 31, na Península, os organizadores citaram:
"Quando a exaltação definha, fico reduzido à mais simples das filosofias: a da resistência (dimensão natural das fadigas verdadeiras). Aguento sem me acomodar, persisto sem me aguerrir: sempre transtornado, jamais desanimado; sou uma boneca Daruma, um joão-bobo sem pernas no qual despegam piparotes incessantes, mas que finalmente retoma o prumo, graças a uma quilha interior (mas qual seria minha quilha? A força do amor?). É o que diz um poema popular que acompanha essas bonecas: A vida é assim, cair sete vezes e levantar oito" (Werther)
Amor.


É DIA 31 NA GALERIA PENÍNSULA: https://www.facebook.com/events/1300222196673178/

RESISTÊNCIA É CRIAÇÃO

Entendemos a resistência como criação seguindo os passos de um pensamento que deseja a diferença. Neste momento de labirintos políticos e lutas convidamos artistas, produtores, realizadores, coletivos, profissionais da cultura e a sociedade civil para uma conversa-debate sobre o processo, os símbolos e as implicações imediatas da atual política instalada no Brasil. A proposição é criarmos um grito de resistência em meio a esta dimensão confusa e catastrófica, partindo do pressuposto de que arte e cultura não são apenas pra garantir o trabalho e exercício intelectual do artista, mas (e sobretudo) existem para garantir a atividade do pensamento e da prática do corpo social, da população como um todo. Central e periférica, do Oiapoque ao Chuí. A responsabilidade da construção de um processo político e cultural também é nossa, agentes culturais.
Local: Galeria Península (Andradas, 351). Porto Alegre.
Data: 31/05 (terça-feira) às 19h

DEBATE ABERTO E PÚBLICO

Participam do debate:

Patricia Argollo Gomes
Psicologa, Mestre em Psicologia Social e Institucional/UFRGS, Dra. em Informática na Educação/UFRGS, Docente, Apaixonada por Arte, Pensamento e Escrita, Militante pelos Direitos Hunamos. Meu conceito chave é Trans.

Ana Albani
Doutora em Artes Visuais pelo PPAV UFGRS. Professora no Instituto de Artes da UFRGS, nos cursos de Artes Visuais e Historia da Arte, onde desenvolve pesquisa sobre Crítica Institucional. Vice-presidente da Associação Nacional de Pesquisadores em Artes Plásticas - Anpap gestão 2015/2016. Atua como curadora e critica de arte.

Pedro Guindani
Nascido em Porto Alegre em 1985, Pedro Guindani atua no mercado audiovisual do Rio Grande do Sul como diretor, produtor e roteirista desde 2006. Entre seus principais trabalhos como diretor e roteirista, estão os premiados curtas-metragens "Os Olhos de Capitu" (2007) e "O que ficou pra trás" (2014), nos quais atuou como diretor e roteirista; a minissérie "Bocheiros" e o longa-metragem "Terráqueos: Vestígios de uma Era Digital" (2014), nos quais foi produtor executivo, assim como nas três primeiras edições do FRAPA - Festival de Roteiro Audiovisual de Porto Alegre.

Lucas Maróstica
é estudante de jornalismo da PUC, ativista LGBT e representante da União Nacional dos Estudantes no Conselho Estadual de Juventude. 

biAh weRTher
fazedora de cine desconstrução*fotógrafa dos gestos submersos*tocadora de theremin*escrevedora de moscas volantes*misturadora de tecnologias* VJ *mochileira do Cinema8ito*desenhadora de nuvens e ventos*criadora de vestidos, coisas com luz dentro, patuás e música experimental.

Francisco Dalcol
Jornalista, crítico, pesquisador e curador independente. Doutorando em Artes Visuais (História, Teoria e Crítica) pelo PPGAV/UFRGS com pesquisa voltada às relações entre arte e política nas práticas artísticas contemporâneas baseadas em viagens, expedições, percursos e deslocamentos. Em 2016, ministrou o curso "Arte e política, arte política ou política da arte? Imbricações entre estética, crítica e política nas artes visuais" pela Anis Cursos, no Santander Cultural.

Nanni Rios
Jornalista formada pela UFSC com especializações em jornalismo digital (PUCRS) e economia da cultura (UFRGS), atua como produtora cultural e ativista pelos direitos humanos em Porto Alegre. É uma das integrantes do coletivo cultural Aldeia, onde mantém uma livraria e promove eventos literários com foco em literatura de autoria feminina e gênero e sexualidade. Às segundas-feiras, apresenta o programa Virada Mix, no canal Octo, sobre diversidade sexual, racial, cultural e de gênero. É uma das produtoras da festa de música brasileira Cadê Tereza?.

Apoio:
Galeria Península

AB i Sal

Hoje acordei feliz e quente. Céu azul mais uma vez. Pássaros de novo. Meu amigo bem te vi cantando na janela e eu me sentindo completa. Vim até a internet disposta a repetir o que falei ontem: Não quero mais saber de tristezas. Fingirei que foi um pesadelo saber que usamos uns aos outros; nos matamos e aos outros com um conta gotas ou com o tiro certeiro. As gentes se machucam, tiram sangue, mentem e saracoteiam em cima das outras. Expulsamos uns aos outros do caminho do sol com o dedo apontado na cara, gritando: vai que a noite mais abissal te aguarda. Assim, damos as costas e foda-se.
Os mais espertos empurrando os mais frágeis pra um terreno árido sem perceber que assim se sufocam também.
Não sobra ninguém quando alguém sangra por força do ódio coletivo, em nome de interesses banais.
Eu era feliz hoje de manhã e queria só repetir que agora aqui é só paz, amor, gentileza, lealdade, sexo (consentido e prazeroso) e risos.
Mas cheguei na internet e ao primeiro enter levei a primeira porrada do dia. As notícias e a competição estão enlouquecendo uns e congelando o coração de outros.
A culpa não é da internet, óbvio. Como não foi um dia do rádio, dos correios, da televisão ou o código morse.
As ferramentas não são o problema, a água turva somos nós, egoístas.
A gente consegue matar a beleza do amor usando até sinal de fumaça. Somos bons na maldade... treinados.
Nós mentimos tanto que eu não posso ser diferente. Também quero mentir. Vou mentir então que tudo foi um sonho ruim e acordei segura porque a gente se ama, nos respeitamos, a gente não mata aos poucos ou com um tiro certeiro aquele que está ao nosso redor desprevenido. E a gente não precisa estar em guarda até dormindo, como num campo de batalha.
Hoje perambulei sozinha com a verdade por lugares desconhecidos reconhecendo minha distração.
Abstraio mas não traio. Ainda não desisti do propósito de falar só de coisa boa que nem aquela mulher de voz trêmula que faz propaganda de iogurteira.
Até sumir do mapa, morrer, virar moradora da última caverna não habitada do planeta ou fingir que tudo está bem quando não está, pode ser uma coisa boa, desde que alguém viva melhor por causa disso. Desde que exista algum sobrevivente.
Quero fugir pra um outro lado em busca de ficar melhor, ser melhor, porque o pior a nossa cara estapeada já sabe de cor.
]bw[

sábado, 21 de maio de 2016

Sobre o nada

Ainda sobre ser artista, a nossa coragem precisa ser dobrada quando dentro do nosso mundo e até dentro de nós mesmos encontramos inimigos. A arte não tem definição nem mesmo do seu espaço e, assim, pode ter muitos porteiros numa mesma porta por onde não caberia sequer o filhote de um rato; e diversos juízes de uma luta que não era pra ser guerra mas é.
Ainda sobre viver de uma coisa que sai da gente e não tem serventia pra uma grande maioria, a nossa coragem tem que ser redobrada quando dentro do nosso mundo existem inimigos movidos por uma competição em busca do nada, do efêmero, de algumas migalhas que uma pequena parcela da platéia nos jogará em forma de estrelas e a gente vai se empurrar e rastejaremos pra juntar e tomar banho com elas pois talvez pareça até pra nós mesmos que a gente só precisa de elogios e uns troféus de muito mau gosto que a gente pode picar, temperar, costurar, reciclar, comer e vestir e sobreviver.
Ainda sobre o artista, a nossa criatividade é uma colagem de aplausos e cuspe que a gente veste e despe e lambemos feridas e é só.

quinta-feira, 12 de maio de 2016

A autora é uma sogra?

Acontece de tudo nessa louca relação entre quem cria, a cria e quem se apropria. 
Há pouco eu postei no meu twitter: "Nada me deixa mais magoada que as pessoas divulgarem imagens do meu trabalho e não darem os créditos. Talvez porque eu me dedico demais..."
Sim, pode ser por que a gente se dedica muito e há segredos e uma relação íntima ao extremo entre nós e a nossa criatividade, mas deve ser mais porque a gente se sente mãe daquilo que criamos... o que dá no mesmo, talvez. Sei lá, com a obra, um artista divide coisas que nunca com uma pessoa mesmo que durma junto por 50 anos.
Me perco pensando nisto porque é contraditória a situação de artistas como que eu passam a vida querendo criticar a propriedade em várias circunstâncias mas defendem a autoria.
A ver, a gente se constrange em colocar o nome na frente, em bater demais no peito, mas a gente espera que as pessoas sejam éticas ou atentas, cuidadosas por assim dizer.
É tudo delicadíssimo e em sintonias muito finas isto da propriedade intelectual.
Só sei que acontece o tempo todo, muitas vezes as pessoas fazem sem querer, por distração, mas machuca e é mais forte que a nossa crítica ao ego do artista.
Quando acontece comigo - e eu deveria já estar habituada - me dá uma dor engraçada e me prova que a propriedade intelectual é algo que transcende a razão. Sinto uma coisa quente no estômago, uma certa náusea, susto e uma decepção com a vida quando algo que saiu das minhas entranhas estranhas aparece como se fosse gerado por outra. Sabe quando tu é assaltada e te levam algo que tu demorou muito pra conseguir; ou quando o teu filho pequeno some no meio do super mercado e te dá uma dor e o teu corpo se curva? É assim a sensação quando não me dão os créditos. Parece exagero, mas tenha certeza que é assim com muitos artistas.
Então a gente poderia dizer que essa necessidade que o criativo tem de assinar seu trabalho em contradição com a vergonha de fazê-lo por parecer excesso de vaidade é um sentimento maternal.
Como não querer deixar o filho ir.
Fico entre as duas vias tentando ser racional.
Primeiramente, creio que a pessoa que inventa, cria, se dedica, passa anos até fazendo um projeto artístico (eles são sempre mais complexos de criar do que parece), precisam se desprender e deixá-los ir.
Segundamente, enquanto o autor de uma obra tem o direito de se desprender, as outras pessoas que fazem parte dela em algum momento ou apenas espraiam por gostar, tem o dever de desenvolver uma natureza sensível ao fato de que a obra que lhe dá prazer veio do ventre de alguém (o artista seria a sogra?) e, portanto, antes de usar e abusar da criação do outro é necessário entender qual é a relação do artista com aquela arte.
Há obras que a gente quer dividir (como no meu projeto FBI, em que enviamos o copião do nosso filme pra outros cineastas reeditarem à seu prazer); há obras que você deixa fazerem download mas não gostaria que remixassem; há trabalhos que você não mostra nem pra pessoa mais próxima e se alguém mexer nas suas gavetas e a encontrar você vai sofrer tanto que talvez não sobreviva.
Você quer entregar para o mundo aquilo que inventa e quando chegar no mundo vai virar outra coisa e não há o que você possa fazer a respeito. Só que esta outra coisa, como um filho, sempre fará parte de você lá no princípio do seu caráter.
Tenho uma certeza de que nesta complicada matemática da autoria o segredo está na delicadeza, na sutileza de uma cultura que não veja as coisas aos pedaços e sim os elos e continuidades.
Há coloridos cordões que nos ligam eternamente ao que sai de dentro de nós e eles precisam ser solenemente respeitados.
Só com menos ansiedade e menos consumismo a gente consegue perceber estas linhas que abraçam a tudo e todos enquanto sociedade, e nisto entra a arte.
biAhweRTher

quarta-feira, 11 de maio de 2016

A mulher e a câmera.

Não sou daquelas pessoas que fala muito sobre as opções técnicas do trabalho. Atualizações dos softwares, micro diferenças entre uma câmera e outra, a guerra das tecnologias, plataformas e marcas... Bá, prefiro pensar na luz. 
Tenho fases... Depende da estação do ano, de como vai o sol, se está nublado, se é um surfista no mar, uma foto de moda, a natureza, o velhinho distraído no centro da cidade, a formiga invisível ou uma banda num palco com uma péssima iluminação vermelha.
Admito que me apaixono por lentes, isto é verdade. Mas não falo muito delas, durmo com elas. E isto é sério, quem dorme comigo sabe que não é raro dividirmos a cama com uma câmera. Tanto que, há alguns anos, numa oficina de cine desconstrução em alguma capital qualquer do país, eu mandei um garoto nervoso dormir com a super 8. Dito e feito, no outro dia ele estava super relaxado e do seu olhar saíram lindas imagens em movimento.
Nessa confusão toda que fica na cabeça, no coração, no estômago e no sexo, fazer imagens - ao menos no meu entendimento - é muito mais sensibilidade do que foco, do que a fita métrica, do que escolher o Iso, O olho sabe, é orgânico... desculpa dizer esta bobagem, mas é talento e não há decoreba na subjetividade.
Comecei um álbum na minha fanpage com as fotos que considero incríveis mas foram rejeitadas solenemente pelos clientes. Felizmente é um fato tão novo pra mim que só há fotos de um cliente e tomara que fique nisto por um bom tempo
Em abril fiz uma sessão de fotos
barata e improvisada como eu gosto porque exige criatividade. Sem recursos pra produção, sem maquiador, assistente, veículo de produção, equipamento de luz.
Só tinha grana pra nós, eu e as lentes.
Fomos. Temos.
Apesar de reunião prévia, de um estudo de referências e de eu ter feito uma pré produção, a sessão que pra mim resultara em 4 séries fantásticas em locações dentro do Hospital Psiquiátrico São Pedro, desagradou imensamente o cliente. Faz parte, não gostar acontece, desrespeitar o profissional é proibido.
Bastante satisfeita com o resultado, sob pressão de um deadline mortal do cliente, optei por uma metodologia. Enviei primeiramente uma série de fotos artísticas para ele ir aprovando enquanto eu ia trabalhando fotos mais naturalistas e uma boa diversidade estética. Agi sem pensar no cachê pois quando eu aceito um trabalho não penso nisto e não trabalho com menor ou maior dedicação, Compro a ideia.
Para minha surpresa, com apenas dez por cento dos retratos enviados, o cliente já um pouco irritado e apressado, me enviou uma print com uma análise fria e meio humilhante que continha riscos e setas sobre as imagens avaliando micro pontos de meia dúzia de fotos que, me pareceu, eu deveria corrigir. Junto vinha uma observação em caixa alta: As outras não gostei. Ponto.
O cliente era muito jovem e talvez nunca tivesse se relacionado com um profissional, então eu respirei, me mantive muito afável e pedi que ele ficasse calmo, larguei o trabalho de um outro cliente bem mais relevante e passei a madrugada enviando fotos em uma outra estética, começando uma tentativa de contemplado e segura de que conseguiria porque foram centenas de disparos com isos, lentes, cenários, luz variados,
Não cheguei a enviar nem metade das opções e descobri que o cliente nem fizera download das fotos, cortando relações e me deixando feito boba por dias a trabalhar para tentar agradá-lo.
Acendi meu incenso, meditei e retornei aos outros trabalhos de relação mais normal.
No dia seguinte, ainda meio sem entender o que tinha se passado, recebo o contato de uma banda de Berlim, pra qual já trabalhei como VJ, pedindo fotos pra uma capa e encarte de CD.
Ora, o trabalho para o jovem cliente que não fora legal comigo era semelhante a este, então pensei: Será que existe um Deus e isto é uma compensação por eu ter sofrido um belo alijamento ainda ontem?
Não sei nada sobre isto!
Quero dizer, não me apetece ficar exultando a câmera nova, o paranauê caro e apenas os sucessos. Eu gosto de falar sobre conceito, sobre autoria, sobre o respeito, sobre a tentativa de fazer os clientes entenderem que "eu to pagando" não pode pautar as relações de trabalho. Gosto de falar sobre erro, sensibilidade e aquilo que a gente aprende na faculdade, sobre esconder a humanidade no ambiente de trabalho..
Eu conheci um fotógrafo que me disse: Se eu sinto que vai ser desconfortável ou se vou ser maltratado, cobro 4 vezes mais.
Pode ser uma boa... Mas há momentos que a gente não pode prever. A única certeza que eu tenho é que eu, além de criar esta vitrine das imagens não aprovadas que, apesar disto, me dão orgulho, vou inventar uma outra redação para contratos de trabalho.
Meus contratantes, a partir de agora, tem que me
assegurar que amam o que fazem, que gostam de olhar nos olhos de quem contratam, que sabem que estão contratando pessoas e não robôs ou escravos e que conversar, respeitar, viver com felicidade e honestidade todos os momentos, profissionais ou pessoais é estar pleno e isto vale mais do que mil notas de dinheiros.
Paz, Amor e Gentileza \o/