quinta-feira, 17 de março de 2016

Ontem eu vi o Cigano Igor e fiz retrato de uma revolução perfumada.

Bom dia lindo dia!
O que dizer de uma geração que só sabia fazer compras e quando acorda pra política sai pra rua com roupas de marca e uma lata de cerveja na mão gritando em coro: "Vai tomar no cu"?
Ontem, saindo do estúdio onde eu estava trabalhando, passei pela calçada da fama e fui gravando as vísceras da passeata até chegar na João Teles.
Não tinha nada de muito interessante pra retratar, na verdade. Carros importados buzinavam, senhores bem vestidos saíam de bistrôs lindamente iluminados com luz de velas e gritavam: "Vagabunda". Jovens corriam com o celular na mão, prontos pra festa, procurando os amigos; sentadas nos cafés mais chiques da cidade diante de drinques e acepipes, senhoras comentavam orgulhosas seus posts de "Lula cachacheiro" no feicibuque.
Eram pessoas brancas, cheias de perfume, numa espécie de micareta da zona nobre, Tentei entrevistar porteiros e serviçais, que eram os únicos não brancos, mas os olhares eram severos e eles ficavam tensos, tímidos, sacudiam a cabeça num não.
As meninas loiras desfilavam com a bandeira do Brasil numa performance que me lembrou os desfiles de 7 de setembro que as escolas faziam quando eu tinha 8 anos e loiras bonitas da oitava série eram destaque fazendo piruetas e todos cantavam o hino nacional. Sério, i-gual-zi-nho!!
Em dado momento, avistei o Cigano Igor! Levava um ar de líder, a caráter com bandana verde e roupa de academia levando uma bandeira do tamanho de seus músculos. A propósito, muitas pessoas com lindos corpos usavam roupa de ginástica. Quem passava à margem do desfile de grife com alguma roupa que destoasse tornava-se alvo de olhares hostis e logo era apontado, tinha que desviar o caminho. Eles estavam exaltados e logo descobriam os inimigos infiltrados.
Em nenhum momento conseguimos escutar qualquer discurso politizado, alguma palavra de ordem com algum pedido concreto.
Senhoras chiques gritavam: "Dilma vagabunda!".
Me pareceu que ali, a ideia transcendia qualquer apelo político. Estive no meio dos rebeldes de vitrine e, pertinho da miscelânea de fragrâncias importadas, entre algumas pessoas que ainda não sabiam bem como se age na rua, - pois novatas em momentos mundanos que não fosse aquele carnaval em Salvador em 1996 - e outras já mais descoladas, se divertindo com amigos; caras malhados de olho nas meninas, casais caros com cachorrinhos de marca, vi algo positivo que unia a todos.
Vi que, agora, gente que devorou livros de boas maneiras tem um lugar pra falar palavrão aos berros. É como uma terapia em grupo. Muito melhor que copa do mundo e carnaval. Senhoras com aaaanos de trauma porque não puderam gritar "porraaa!" quando alguém pisou no seu pé naquele jantar no Juvenil em 1965 soltaram finalmente o urro: "Putaaaa!"
Achei bonito, viu.
Até que começaram a me estranhar e eu, que não sou boba nem nada comecei a gritar: "É isso, morte aos bolivarianos"; E meus amigos gritavam: "Corta a barba desses comunistas". E eu fiquei louca e abri os braços e gritava e os senhores faziam festa pra mim e eu dizia: "MORTE AOS COMUNISTAS!";
Foi uma be-le-za!
Depois, já no meio da Independência, um maior número de pessoas estranhas ao desfile começaram a aparecer ao redor pra assistir e, de repente, os manifestantes pararam como quem não soubesse pra onde ir. Estavamos nos distanciando demais das lindas ruas ricas, o que fazer? O grito arrefeceu... murmúrios. Uma jovem com a bandeira falou: "- Mãe, pra lá é o centro?"
Percebi um certo desconforto de alguns ao se afastarem do Moinhos de Vento. Creio que eles deram ré e foram pro Parcão, porque ir pra rua tudo bem, mas centrão já é demais.
Descemos a João Teles rumo ao aniver do Fredi Chernobyl. Eles ficaram lá, liderados pelo Cigano Igor.
Foi lindo.
Assinado: A rapariga que foi na manifestação e gritou um monte de palavrão oba!
>bw<

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