sábado, 27 de setembro de 2014

A senhora e as senhoras.

Descia eu pelo elevador de serviço num dia desses em que se aproximava um temporal. Como sempre com roupa confortavelmente suja de tintas e colas, de quem está trabalhando no ateliê.
Uma senhora de uns 65 anos, ar de cansaço, entrou comigo. Comecei a conversar com ela e antes do térreo já descobrira que mora em Cachoeirinha, pega dois ônibus e ainda tinha que cuidar dos netos, pois a filha é mãe solteira e ela tem que cuidar da casa da patroa, no meu prédio, pra sustentar sua família. Foi muito legal a conversa e eu senti vontade de dar um abraço nela. Já no térreo, conversamos mais um pouquinho e ela me perguntou sorrindo: - Tu também trabalha aqui?
Respondi que, de certo modo sim, pois meu local de trabalho é na minha casa mesmo. Ela ficou constrangida e pediu desculpas. Daí não me contive e a abracei dando risada, explicando que, na verdade, me senti lisonjeada.
Já nos afastando ela me disse: - É que tu sabe, né minha filha, o pessoal aqui não é de dar trela pra gente!
E lá, se foi ela, com medo de ser pega pela chuva, enquanto eu gritei de longe:
- Em quem a senhora vai votar?!
- Na Dilma, claro! disse ela com olhar de criança marota.

Essa senhora povoou meus sonhos por dias, mas nunca mais a vi, horários diferentes e tal. Me apaixonei por ela imensamente.

Lembrei disso hoje, após ler posts de umas senhoras, talvez mães, creio que uma ou outra até avó, comentando que as pessoas que votam na Dilma são "pobres coitadas", gente que não sabe nem escrever direito. Havia  na conversa uma plaquinha dessas de deboches que circulam com letras arial em cores primárias e o artista gráfico não assina (acho que ninguém assinaria essas artes toscas e mal redigidas, certo?) e os comentários debochavam das pessoas pobres que não sabem escrever, falam errado...

Diria que é contraditório odiarem as ações que tem levado os pobres para as escolas e universidade, já que tanto reclamam que pobres não tem escolaridade.
E diria ainda que ser pobre e não saber escrever é compreensível, mas uma classe média exibidora de títulos não saber escrever é imperdoável. E isso é o que mais se vê quando desandam a arrotar status e xingar os menos privilegiados que limpam seus pínicos.
Além do mais, a língua falada é livre e o caráter de uma mulher brasileira não se forja nessa ou naquela classe social, muito pelo contrário.
E complementaria que uma mãe de família, avó, tia, qualquer mulher adulta que se considera bem educada, elegante, de bom gosto, com poder de consumo de coisas e mais coisas, deveria envergonhar-se de falar mal de gente mais pobre, quando não teriam nem suas calcinhas bejes para vestir, não fossem esses seres inferiores, muitas vezes em condição de trabalho escravo.

Mais que tudo, se eu quisesse uma amiga pra conviver, tomar chá na cozinha, contar sobre a vida e trocar receitas e mudas de plantas, seria aquela senhorinha que já idosa ainda trabalha numa casa de família de classe média pra sustentar seus netos, enquanto as patroas se metem na internet, escrevendo mal e porcamente ofensas e maldades contra os que lhes servem.
Essa gente que odeia pobres e acha que sabe votar melhor porque fez curso "superior" precisa é voLtar pro útero e nascer de novo, reaprender sobre a vida, respeito, igualdade e sobre amor.

Voto com os pobres coitados, com as mães que tem direito ao bolsa família e com os estudantes que conseguem chegar aos cursos universitários graças às cotas.

Beijinho no Ombro ;)

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