sexta-feira, 10 de março de 2017

A minha parte mais bonita.

As mudanças que se operaram em mim, para melhor, vem do meu feminismo. Esta verve, esta coisinha, essência que estava aqui desde que eu era um mero grão e que tentaram sepultar desde cedo, então só se mostrava quando me sufocavam pela décima vez, quando me oprimiam de novo, quando me abusavam novamente. O feminismo em mim só vinha em forma de raiva, de ira, de revolta, de urro, de não aguentar mais, tornando-se uma parte difícil, um lado meu do qual me peguei tento vergonha muitas vezes porque ele era rude e o usavam contra mim, me apontando, me excluindo, me julgando.
Porém, num certo dia quando acordei, notei que ele estava livre, solto no meu peito, na garganta, pelo quarto. E era parte real, fluído, natural, belo, intrínseco.
Um dia - ou aos poucos - não vi mais sentido em envergonhar-me do meu estado crítico diante do meu eu covarde e da cultura que me rodeia.
Meu feminismo já não precisava ficar oculto até não poder mais.
Meu feminismo, num certo momento veio todo, floresceu em mim e não havia mais como separá-lo de qualquer das minhas células, poros, neurônios... Descobriu a senha, me tomou toda e ficou plácido, me trouxe respostas.
Nunca fui tão bonita porque meu feminismo é a melhor parte de mim; nunca fui tão completa, nunca tão honesta, tão tranquila e tão segura... Nunca fui tão feliz antes de entender que feminismo é o meu feminino liberto dos modelos, meu eu sem máscaras, minhas vontades respeitadas e minha coragem aumentada.
Se eu gritar é porque preciso, se eu sorrir é de verdade, se eu trepar é porque quero, se eu chorar é porque sou humana, se me revoltar é porque penso, se sou perfeita é porque sou imperfeita, se estou linda é porque sou única, se digo não é porque não. 
biAhweRTher

quinta-feira, 9 de março de 2017

Dando a luz.

Hoje estávamos iniciando a pré-produção das montagens do eixo de Artes Visuais do FLõ festival do livre olhar, lá na La Photo Galeria e numa certa hora uma chuva gigante veio lavando tudo e trazendo a noite. 
Algo começou a mudar dentro de mim naquele momento. Vi minha equipe se empoderando, sentindo-se dona do festival. Fiquei pequena, observando. Meu nervosismo de pré festival foi dando lugar a uma sensção de segurança e paz. Vi as pessoas que eu apresentei umas as outras convivendo, trocando ideias e se tornando amigas, tomando pra si decisões, enriquecendo o nosso mundo.
Percebi que chegou o momento em que o festival se liberta um pouco do meu útero criativo, intelectual, conceitual.
Senti que ele começa a tomar forma não só a partir dos meus sentidos, leituras, interpretações.
O Bom Fim estava às escuras, andei nas ruas e, pela primeira vez em meses, tive uma necessidade de perder o controle do que acontece, descansar algumas horas da liderança.
Comprei um malbec e só penso em ficar sozinha ou com alguém que não esteja sabendo nada sobre o festival.
Vejo pessoas que não conheço divulgando e comentando os eventos. Assisto os artistas (são cerca de 100 obras/projetos no programa), mais de 300 envolvidos direta e indiretamente em cada exposição, espetáculo, sessão de filmes...
Observo-os partilhando orgulhosos suas participações, alguns sem mesmo saber que há uma pessoa chamada biAhweRTher que inventou esta casa cheia de janelas.
É que não importa quem foi, importa quem seremos.
Nunca desisto do que eu quero, sou workaholic e idealista no nível máximo. O envolvimento das pessoas é diretamente proporcional à minha paixão, mesmo que eu, em algum momento, já não tenha a mínima importância.
O festival é como nossos filmes, nossas músicas, nossos escritos e invenções. Há o momento em que não temos mais domínio algum sobre elas.
Ainda assim, apesar de isto ter crescido e não ser mais só um projeto meu no silêncio do meu lar estúdio, eu consigo entender onde eu queria chegar e sinto orgulho de mim, por unir tantas pessoas, por fazer o quase impossível num país que odeia artistas independentes.
É como estar sentada sobre essas nuvens cinzas, sentindo o ar mais fresco e gostando de si mesma.
Sem falsa modéstia, não sei porque eu faço tudo isto, mas sei porque aprendi a gostar de mim.
Que a semana do dia 21 a 26 de março de 2017 seja o melhor que pudermos fazer, ser e subverter.
Um beijo

biAhweRTher

quarta-feira, 8 de março de 2017

O PECADO INFINITO.

É sobre levar o mundo nas costas desde que nos conhecemos por gente, sejamos anarquistas, subversivas, carolas ou niilistas; libertárias, covardes, amordaçadas no porão, de baton, tensas, intensas, vazias recatadas do lar. O elo é uma ferida.
É sobre o fardo e um grito. 
E é sobre essa emoção que está envolvendo boa parte de nós no mundo inteiro no dia de hoje. 
Cada uma é um pequeno mundo gerador de vidas e de mortes - normalmente a própria.
Apenas mais uma, me sinto uma formiguinha, me sinto um dragão, uma leoa, uma ET, uma moça que usa o manto da invisibilidade... Só sei que estou com borboletas no estômago, na garganta está meu coração.
E sendo prática, preciso, devo parar algumas horas para participar da mobilização mundial de hoje. Como dizemos no cinema8ito... 8... i n f i n i t o, 8ito é par, 8ito é coletivo.
Se eu não for encontrar minhas iguais hoje, se eu não sair às ruas, minha culpa será imensa.
Se eu for, a produção do FLõ festival do livre olhar vai parar por algumas horas e minha Culpa também será imensa.
C U L P A. A chave que manipula as minas e nos torna, HOJE, manas. Culpa, o segredo criado pelas instituições para controlar nossos passos. Seja ateia, seja carola, seja puta, seja virgem, seja velha, seja nova, há sempre um espectro apontando um delito inexistente, eficiente.
Precisamos discutir, superar,
desconstruir a culpa.
A propósito de pecado, esta foto foi censurada várias vezes pelo facebook. Fiquei de "castigo" por publicá-la inteira então, aqui, a cortei. Certa vez, um rapaz, ao vê-la, me disse que sentia nojo e avisou que estava "denunciando". A expressão denunciada, censurada, era só minha pele nua suja de vermelho. Infração.
Um beijo e força para todas as manas neste dia de LUTA! Que todos os dias sejam assim. Que não exista competição entre nós, só o olhar e a voz de cada uma, diferente, única, a complementar os milhões de outros olhos e vozes. #NenhumaaMenos
biAhweRTher
Clandestina
Biah Werther II


terça-feira, 7 de março de 2017

Pelos Pelos

Existe cultura, cultura, cultura e cultura. Umas para nosso sim, outras para o não.
Quando eu tinha uns 13 anos comecei a depilar partes do meu corpo por uma imposição. Cegamente comecei a fazer algo que nunca tinha feito parte dos meus pensamentos a respeito do meu corpo porque algumas amigas começaram a me cobrar isto e alguns meninos riam de meninas com pelos no corpo.
A primeira vez fiz escondida de minha mãe, usando um aparelho de barba do meu pai. Cortei minha perna embaixo do chuveiro e saiu muito sangue. Me senti num rito de passagem sozinha naquele banheiro de azulejos azul calcinha.
Foi ruim passar a fazer parte de tal cultura, espécie de obrigação.
É tão fora dos meus valores, tão irrelevante me depilar para me sentir mais mulher ou mais bela, que nunca fui num desses lugares onde as mulheres se torturam com ceras quentes. Só conheço pelos filmes e acho meio ridículo.
Hoje, infantilizar o corpo da mulher tirando todos os pelos, em determinados nichos, é uma obrigação, uma lei. Claro que não faço parte disto, mas me depilo como quem carrega um fardo. Pra ter menos trabalho e porque me machuco  s e m p r e  com lâminas, compro uns cremes caros que facilitam mas pesam no orçamento, então eu sou daquelas que podem passar por você de biquini na praia toda linda com os pelinhos das pernas bem faceiros e se você não curtir dou muita risada e penso:
Você tá revoltadinha porque ainda não me viu no inverno, por debaixo de mil casacos!!
Depilação não é higiene. Higiene é banho. Depilação é uma bobagem cultural pra agradar caras machistas e uma sociedade patética que quer todas as mulheres fingindo que tem doze anos para excitar senhores pedófilos.
Um beijo.
biAhweRTher

domingo, 5 de março de 2017

Fastfood de carne humana.

Desconfio de quem consegue sorrir, dormir, entrar num fastfood, neste domingo, 
sentir-se em casa dentro do ambiente frio de cores estudadas e mensagens subliminares.
Não confio em alguém que consegue viver normalmente após o assassinato do menino João,
que teve seu frágil corpo espancado até a morte por seguranças do fastfood Habib's. 
Ele foi jogado na calçada a espera dos corvos da nossa cultura: Nós.
O apelo que todxs devemos fazer não é o da hashtag do dia para amenizar nossa responsabilidade.
O apelo é para nossa própria consciência, ao som dos gases de nossas entranhas.
O apelo é diante do espelho, é sobre empatia.
Sinta vergonha se você é um pai que pensa que só importa na sua sociedade aquilo que acontece "da porta pra dentro", pois sua ignorância o impede de entender que somos um corpo só.
Envergonhe-se se você é uma mãe que ensina competição e arrogância pois dignidade, amor e respeito são direitos de todos, não apenas dos seus filhos.
Não se iluda, não se entenda imune, não se julgue imaculado.
Cada um de nós matou João e matamos a cada minuto dos nossos dias boçais todos os outros meninos e meninas sem lar, viciados, sem pais, sem país, com seus olhos que são o espelho do qual fugimos idiotizados, ruminando, rosnando, correndo dessas crianças como se os monstros fossem eles e não nós.
Todas as crianças são de todos os pais, responsabilidade de todos. Assim está escrito nas leis mais básicas de todas as sociedades desde que o mundo é mundo. Você não sabe porque está ocupado fazendo compras e chutando crianças de rua.
Se você não sabe nada sobre isto, está na hora de entender antes que seus muros não sejam suficientemente altos para segurar a culpa lá fora. Sinta medo de você mesmo, tome um banho na vergonha e mude antes que o seu bunker seja invadido por você próprio, pelo lado seu que está lá fora, espelhando o seu escárnio. Todo o ódio que se revelará contra a injustiça e virá contra você, emanou do seu egoísmo. Não haverão muros suficientes. Você não é vítima, você é cumplice.
#BoicoteHabibs
biAhweRTher