quinta-feira, 6 de abril de 2017

S O L

Encontrei este texto, de 6 de abril de 2013, no meu segundo perfil do facebook.
Não é um material tão incrível, penso eu, como leitora. Contudo, me trás a memória de um momento importante da vida, de início de uma longa transição, o encontro comigo e a necessidade da solidão. Tomada de decisões que me levaram à atual fase profícua e entre muitas pessoas... Além do mais, algumas leitoras que admiram minha escrita se sentiram tocadas quando publiquei.
Assim, copio aqui no blog pra não perdê-lo.
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S O L

Solidão deveria ter outro nome. Deveria ser um palíndromo que começa e termina com sol.
Nunca parei antes a comparar as intensidades da solidão sozinha e da solidão acompanhada. 
Essa semana, nas passeatas, eu encontrava e me perdia dos amigos. Prender-se, perder-se. Su-bli-me! 
Até os 18 anos eu tinha uma coisa que um espírita chamou de desdobramento e a psicóloga chamou de: hum-hum. 
Era mágico. Muitas vezes, quando estava na minha cama, eu me via, fora do corpo. Queria pedir ajuda, claro. Mas quem diz que a voz saía? Minha consciência estava com o corpo de cima, que voava sobe mim, preso ao meu corpo real por feixes de luz multicolorida que saíam do meu umbigo. Um dia, vivo, meu segundo corpo quase saiu pela janela, flutuando. Pavor! E se eu nunca mais voltasse em mim?
Casualmente, quando eu saí da casa de meus pais pra descobrir o mundo, nunca mais vi os feixes de luz saindo do meu umbigo. O que não significa que não tenho mais de um corpo, um na terra, outro no céu, mas não consigo mais ver aquilo que os prende um ao outro. O certo é que, hoje, aprecio como se fosse um orgasmo quando me perco na multidão. O corpo que voa, saindo pela janela, deixando o outro ali a descansar seus medos.
A propósito, acho que já escrevi várias vezes sobre isso, de não saber nada sobre turmas e bandos. Distraio-me e traio (não confundir lealdade com fidelidade, por favor!).
É uma emoção sem limites falar com estranhos – que são todos - num diálogo contínuo, pela vida afora. Uma vez, as 6 da tarde, no meio da Cinelândia lá no Rio, eu e um amigo começamos a gritar coisas loucas de braços abertos, rodando e, ao nosso redor, todos estavam loucos, vendendo, tocando guitarra por moedas, falando de futebol, discutindo, se rindo, reclamando da chuva, correndo pra algum lugar. Ninguém nos via!!! Foi nesse dia que tive a certeza de que pode ser lindo quando ninguém me percebe.
Nesse mundo cheio de bengalas que nós inventamos pra fugir de nós mesmos, talvez o mais próximo do auge de liberdade que possamos conhecer, seja estarmos sós. De preferência, sem referências, mas daí é pedir demais. Fechar-se num pequeno grupo talvez dê uma sensação de confiança. Assim, você é sempre obrigado a ser muleta de alguém e, claro, exigir que outros se prestem ao mesmo papel.
Hoje, tirei a tarde de sábado pra esse silêncio da garganta, falação dos pensamentos. Algumas horas sem ninguém é tão ou mais incrível que as festas loucas entre vários amigos, bebendo, fumando, dançando.
Nunca perguntei se todos pensam como eu, se todos sentem essa mesma explosão luminosa, metafísica, quando tiram um tempo pra se sentirem sós, soltos no mundo, pequenos, uma gota, uma bolha, um micro ponto.
Não consigo lembrar-me quando foi a primeira vez que me escondi das outras pessoas a pensar, ler, fotografar, fazer nada, olhar as nuvens, sentir o cheiro dos jasmins lá no sítio. Desde que me conheço por gente, faço isso, eu fujo em direção a ninguém. Depois, já adolescente, veio essa mania de viajar sozinha, perder-me, falar com estranhos, sumir. Insegurança de não ter ninguém ao redor que saiba meu nome. Ninguém a me julgar, ninguém para me ajudar. 
Combustível. Substância. Solidão. 
Sol
Uns emprestam sua companhia, alguns se prestam, outros se dão.
Lua. Vou a uma festa!
biAhweRTher

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