quinta-feira, 25 de junho de 2015

A mais bela punk e o São João.

Minha irmã, que morreu há alguns meses, nunca foi magrela como eu. Ela era sempre a mais linda e moderna nas turmas de adolescentes que eu admirava de longe enquanto aprendia com seus LPs do Pink Floyd, Led Zeppelin e Yes. Desfilava firme entre os fãs apaixonados e dava porrada em quem viesse com elogios bobocas. Eu era tímida e ficava num canto do recreio com um livro, escondida nas toucas e cachecóis que a mãe tricotava, conversando com os cheiros do inverno, sofrendo bule de umas meninas loiras lindas e até de professoras. Ela não me dizia nada, era até meio fria comigo como toda a menina de 12 ou 13 anos diante dos irmãos pequenos, então eu vinha a saber só depois, através de colegas, que ela virava bicho quando descobria que alguém tinha me magoado. Não sei o que fazia, só sei que teve gente até me pedindo desculpas no dia seguinte.
Num ano daqueles, os colegas da quinta série votaram nela como mais bela prenda. Teve um ataque, ofendeu-se, chegou em casa puta da vida. Minha mãe tentando lhe mostrar que era um posto bonito, que poderia costurar um belo vestido.
No dia da festa junina, as concorrentes das turmas subiram no palco em fila, sorridentes em seus vestidos de rendas. Minha irmã, após insistirem em chamar seu nome, apareceu no palco atrasada, de botas pretas e a minissaia mais linda eu já vi. Quando todos fizeram silêncio, chocados com seu figurino, ela pegou o microfone, soltou uma breve frase feminista e saiu da fila de prendas, desceu as escadas batendo as botas incríveis, o nariz no céu! Adolescentes aplaudindo, os pequenos rindo da minha cara, os adultos horrorizados.
Eu, la do fundo, me orgulhei dentro das luvas, cresci e hoje sou igual a ela. Meu rosto nunca mais ficou quente de vergonha, o que me deixa corada é a gargalhada, esta felicidade de, diariamente, nos pequenos palcos, saber declinar da competição entre as mais prendadas. Tem ocasiões em que decepcionar é mais doce do que ser agradável. Há dias em que descobrir que alguém que amo tem vergonha de mim - porque artistas, ainda hoje, são irmãs das prostitutas - é me aproximar da certeza de que posso ser uma mulher livre.
]bw[

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