domingo, 9 de julho de 2017

Quando o funk é mais rock que o roquenrou

Grande parte dos meninos e meninas de cultura branca ganham uma boa guitarra dos pais no natal, são criados para se imaginarem superiores intelectualmente, com mais bom gosto para as coisas da vida, até por terem mais acesso. Moram no apartamento de classe média e tem um preconceito exacerbado em relação às MCs do funk que vivem do outro lado da cidade.
Contraditoriamente moralistas, reclamam do rebolado nas expressões de periferia mas rebolam os cabelos ao som das letras mais machistas e consumistas que os roqueiros gringos conseguiram escrever em inglês nos últimos 50 anos. Só pra constar, seus bisavós também já reprimiram o samba.
Beijinho no ombro, sem pedir licença, há tempos as funkeiras vem se empoderando e abordando questões feministas, não que sejam obrigadas. Quem quiser que rebole pra ganhar a vida e não é o moço de faculdade, amante de Bukowski que vai se achar no direito de sentar no seu quarto cheio de posters de vocalistas machistas e resolver se está permitido às funkeiras falarem de sexo em suas letras. 
Se você olhar ao redor estamos lotados de metaleiros que bradam discursos de ódio, machismo, white power, homofobia... Ok, mas isso é outra história, foi apenas um parêntese. 
Uma coisa me incomodava ainda em algumas funkeiras, que era a competição por homem em algumas letras que, a bem da verdade, estão mirrando. De qualquer modo, como qualquer outro estilo, o funk tem também várias vertentes e vai se misturando, Há funk que namora o rap, o samba, o rock, o eletrônico... por ai vai. 
Li em algum lugar que a Valeska Poposuda modificou a letra do seu antigo hit Beijinho no Ombro, por considerar que ele incentiva uma disputa vazia entre mulheres. De fato, na periferia, onde a maior parte das casas é sustentada por minas, o empoderamento e a cooperação feminina é questão de sobrevivência. Deixe para as estudantes da escola de princesas se puxarem os cabelos por causa de homem.
Achei muito roquenrou a atitude da Valeska, como acho a MC Carol muito roquenrou e várias outras minas que estão chegando e apontando o dedo na cara da sociedade.
Não sou muito adepta do rock clássico. Minhas bandas sempre misturavam estilos e as novas bandas livres que estão rolando, retomando a tendência em renegar um "estilo", não aceitando que lhes imprimam um rótulo, são as que mais me agradam. Isso sim é rock, no sentido de atitude diante da sociedade.
Com certeza, você vai me falar de gosto musical, que está além de atitude e letra. Concordo, há bandas com letras extremamente babacas mas os caras tocam muito. Mas como eu canso de escutar sempre a mesma coisa, sigo pensando que o rock clássico se basta nas primeiras bandas, há décadas. Não vejo graça em escutar guris fazendo um cover disfarçado de autoria. Existem vinis antigos que os seus avós podem lhes apresentar. Hoje ninguém mais precisa sair de casa pra escutar uns carinhas cantando que "óh garota, eu sou foda, eu sou sujo, eu fumo muito baseado, eu vou te comer." Vai nada, você é só imagem!
Inclusive, como o rock tradicional está velhinho, acho que nunca veremos um ídolo aparecer na mídia, com seu botox, fazendo um mea culpa, como fez a Valeska Poposuda e modificando alguma letra que, há 30 anos, faz adolescentes baterem cabeça enquanto entoam que meninas são vadias e eles podem matá-las caso elas transem com outros caras.

Um beijo
biAhweRTher

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